Um áudio obtido pelo “ge.com” revela um suposto esquema de comercialização irregular de camarotes do Morumbis em dias de shows, envolvendo Douglas Schwartzmann, diretor adjunto das categorias de base do São Paulo, e Mara Casares, diretora feminina, cultural e de eventos do clube e ex-esposa do presidente Julio Casares. Na gravação, Schwartzmann admite que ele e outras pessoas teriam obtido ganhos financeiros com a prática.
Segundo o conteúdo do áudio, o camarote 3A, identificado em documentos internos como “sala presidência”, teria sido repassado a uma intermediária, Rita de Cassia Adriana Prado, responsável por explorar comercialmente o espaço durante o show da cantora Shakira, em fevereiro. Os ingressos chegaram a ser vendidos por até R$ 2,1 mil, com faturamento estimado em R$ 132 mil apenas nessa apresentação no estádio do São Paulo.
A situação ganhou contornos judiciais após Adriana ingressar com uma ação na 3ª Vara Cível de São Paulo contra Carolina Lima Cassemiro, da Cassemiro Eventos Ltda. A intermediária alega que Carolina reteve, sem autorização, um envelope com 60 ingressos do camarote no dia do show, após o pagamento parcial do valor combinado. O caso também foi registrado em boletim de ocorrência.
No áudio, Schwartzmann demonstra preocupação com as consequências do processo judicial e afirma que o esquema poderia ser revelado à Justiça. Em diversos trechos, ele pressiona Adriana a retirar a ação, alertando para possíveis danos à imagem de Mara Casares, de Julio Casares e do superintendente Marcio Carlomagno, citado como responsável por autorizar a cessão do camarote. O dirigente também admite, em determinado momento, que “ganhou” com o repasse de camarotes.
Mara Casares, por sua vez, aparece na gravação pedindo que Adriana encerre o processo para evitar prejuízos à sua trajetória no São Paulo Futebol Clube. A diretora afirma ter planos futuros no São Paulo e diz que seria a principal prejudicada caso o caso avançasse judicialmente.
Os áudios
No processo, Adriana diz que Carolina pegou de suas mãos um envelope com os 60 ingressos do camarote 3A do Morumbis, no dia 13 de fevereiro, sem autorização. Adriana afirma que os ingressos foram comprados pela empresa de Carolina por R$ 132 mil, mas R$ 100 mil foram pagos.
Adriana registrou um Boletim de Ocorrência na 34ª Delegacia de Polícia, em São Paulo. Por isso, ela foi pressionada pelos demais envolvidos. Os registros de uma telefone foram gravados e acessados pelo “ge.com”.
“Você nunca soube que aquilo era feito de forma clandestina? A palavra é essa. Ou você não sabia? Você sabia ou não?”, questionou Douglas Schwartzmann. “Eu não tenho camarote lá. Veio de quem? O que vai acontecer: a Mara vai ter que se explicar. Como é que faz no clube a hora que souber que ela te deu um camarote para explorar? Você vai acabar com a vida da Mara dentro do clube. E do Julio, porque ela é (ex) mulher do Julio”. completou.
“E o Marcio vai ser mandado embora, porque foi ele quem concedeu o camarote para ela (Mara). Eu não tenho nada com isso, não tenho meu nome em nada. Não peguei camarote nenhum, não tenho nenhum documento lá. Agora, a Mara tem e o Marcio também. Quer prejudicar a Mara e o Marcio? Só queria entender o que você quer fazer com isso. O Márcio Carlomagno, CEO, me perguntou: “já encerrou o processo? O que nós vamos fazer? Eu vou ter que envolver o nome de todo mundo aqui, vou ter que declarar a verdade”. Acabou de me mandar. Eu falei: “não, fica tranquilo que a Mara está conversando com a Adriana, e ela vai retirar o processo”. Acabei de escrever. Aí você faz o que você quiser, eu não posso fazer mais nada. Eu não tenho como me envolver nisso”, seguiu o diretor.
Douglas insiste para que Adriana sobre o risco de descobrimento do suposto esquema. “Eu vou explicar de novo: você comprou ingresso para vender para quem e de onde? Do camarote “X”. Como é que você tinha esse camarote para vender? Porque ela (Carolina) vai falar que comprou do camarote tal, vai mostrar o contrato. É tudo fictício, querida! Você acha que vai ganhar o quê? Aquilo tudo é uma ficção. Você vai foder com a vida da Mara, e o São Paulo vai ter que declarar que aquele camarote não era comercializado, que foi clandestino e que foi feito tudo de forma errada. Você vai perder e ainda vai fo*** com a vida dela”.
Após, Douglas insiste para que o impasse judicial seja encerrado. “Seu advogado sabe que é tudo clandestino? Quer que eu explique para ele como você obteve esse negócio? Você quer que eu ligue para o seu advogado e explique que você não tinha direito de comercializar aquilo? Porque você sabe que não tinha. Eu, você e a Mara sabemos”.
Adriana responde Douglas. “O que eu sei é que vocês me dão um camarote e eu posso passar para algumas empresas, alguns patrocinadores”.
Porém, Douglas assume que “ganhou” com o repasse de camarotes no show da Shakira. A preocupação principal de Mara Casares é com sua reputação no São Paulo. Ela dá a entender que conhece Adriana há muito tempo. “Se você puder fazer esse favor, eu vou agradecer bastante, e a gente dá continuidade na nossa vida da forma que sempre foi, com uma relação de confiança, com respeito, porque foi o que eu fiz a vida toda com você. Não quero mudar esse percurso da nossa amizade que a gente construiu. Eu preciso da sua ajuda. Nunca pedi nada para você, e agora estou precisando muito mesmo da sua ajuda. Isso interfere em uma série de coisas, não é uma coisinha simples”.
Mara Casares, que tentou avalizar sua candidatura à presidência do clube nos últimos anos, admite que poderia ser prejudicada no processo.
“Adriana, posso falar? Vou pedir e já pedi hoje encarecidamente. Retire esse processo, por favor. A única prejudica serei eu. E mais, serei eu, esse processo dará tanta volta, tanta volta, serão anos e anos, eu estarei fodida e você não vai ter recebido. Essa vagabunda com quem você tratou foi vagabunda, só que o que adianta eu falar que ela foi vagabunda? Que isso e aquilo? Para a gente ter futuro, a gente precisa limpar o presente. Eu estou percorrendo dentro do São Paulo um caminho profissional de futuro para assumir coisas grandes. E eu vou ser prejudicada. Só isso. Eu falei isso para vocês sempre. Não podemos ter problema. Não podemos ter problema. Eu sempre te falei isso”, disse Mara.
Segundo o “ge.com”, a ligação foi gravada antes da sequência de shows no Morumbis de setembro a novembro. Douglas lembra da possibilidade de a “parceria” deles acabar antes das exibições de Imagine Dragons, Dua Lipa, Linkin Park e Oasis. “O que eu falei é que nós fizemos um negócio fora do padrão para te ajudar, ajudar a Mara e a mim. É a única verdade desta história. E agora o que você está fazendo? Prejudicando todo mundo. Eu não falei nada, ao contrário. A gente estava tentando resolver, porque tem cinco ou seis shows em novembro, se não me engano, agosto”, disse Douglas.
O diretor adjunto de futebol de base do São Paulo alerta para a possibilidade de Mara ser prejudicada. “É uma decisão sua, Adriana. É isso que a Mara quer saber. Se você vai foder ela ou se você vai ajudar. Só isso”, comenta Douglas. Adriana rebate diz que não “pretendo ferrar ninguém”.
“Ela não ouviu de você até agora: “Mara, vai ficar em casa sossegada, vai trabalhar, cuidar da sua vida, que eu vou encerrar o processo”. Se você não consegue responder isso, a gente já entende o que vai acontecer. Não tem meia conversa nisso, não temos que enrolar as pessoas, Adriana. Não dá para ficar enrolando, não é assim que a gente trata as coisas. A gente tem que ser direto. Mara, não vou retirar. Mara, vou retirar, sou sua amiga, você me ajudou e não vou te fo***. É só isso que você tem que responder para ela ou ser honesta: ‘não vou retirar, fo*** você'”, responde Douglas.
Douglas também aconselhou a ex-esposa de Julio Casares. “Mara, vou te dar um conselho, com todo respeito. Se não sair esse processo, você vai ter que testemunhar contra a Adriana. Você vai falar que não teve participação, que você nunca deu nada, que você foi lesada. Que nem sabia disso. Vai ter que ficar do lado da outra lá”.
De acordo com o “ge.com”, Adriana, Mara e Douglas não explicitam há quanto tempo faziam negócio nem a quantidade de camarotes que foram negociados.
Camarote
Em nota, o São Paulo confirmou que o camarote 3A pertence ao clube e informou que, no dia do show da Shakira, o espaço estava destinado à diretoria feminina, cultural e de eventos. O clube afirmou desconhecer o teor do áudio e negou a existência de qualquer esquema ilegal. Em nota posterior, reiterou que refuta a comercialização irregular do camarote.
O que dizem os citados
Mara Casares reconheceu que o espaço foi cedido à intermediária Adriana Prado, mas negou ter recebido qualquer benefício financeiro. Segundo ela, a cessão ocorreu de forma pontual e baseada em uma relação de confiança, quebrada quando Adriana teria repassado o camarote a terceiros sem autorização. A dirigente afirmou ainda que chamou Douglas Schwartzmann apenas para auxiliá-la na tentativa de resolver o conflito.
Citado na gravação, Marcio Carlomagno declarou ter sido surpreendido pelo uso de seu nome e negou que o camarote tenha sido utilizado de forma clandestina. Já Carolina Lima Cassemiro afirmou que não sabia da irregularidade do espaço e alegou ter sido enganada, sustentando que cumpriu o acordo firmado.
Douglas Schwartzmann e Rita de Cassia Adriana Prado não responderam aos contatos do “ge.com”.
O que diz o São Paulo?
O São Paulo Futebol Clube informa que tomou conhecimento do conteúdo do áudio por meio da imprensa e que realizará a devida apuração dos fatos. Com base nessa análise, o Clube adotará as medidas que se mostrarem necessárias.
Na manhã desta data, os conselheiros Douglas Schwartzmann e Mara Casares solicitaram licença de seus respectivos cargos na gestão.
Punições?
De acordo com o estatuto do São Paulo, condutas que causem dano à imagem do clube podem resultar em punições que vão de advertência à perda de mandato e inelegibilidade. Advogados ouvidos pela reportagem avaliam que o caso pode se enquadrar no crime de estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal, com pena de um a cinco anos de reclusão, além de multa.
Fonte: Cnn Brasil




